Uma pitada de reportagem: o autêntico “ragú alla bolognese”

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Eu sou dos clássicos, não que não goste de coisas novas. Vivo de comer e de falar de comida. Logo, não há quase nada que eu não prove e tente gostar. Mas penso que, se foi passado por gerações, sobreviveu ao tempo e aos modismos, é porque é bom. Deu certo de fato! Das massas então, nem se fala. Nada bate a tríade pesto, carbonara e claro, bolonhesa. O último será o nosso assunto de hoje.

O “ragú alla bolognese” é tão importante para os italianos que eles se deram ao trabalho de investigar, estudar e pesquisar até chegar uma receita oficial que foi registrada em 17 de outubro de 1982 na Accademia Italiana della Cucina (Academia Italiana de cozinha). A fim de manter viva a tradição de culinária de Bolonha, na Itália e no exterior. Ainda assim não há uma receita autêntica, cada família em Emilia Romagna com certeza tem sua própria versão. Mas algumas coisas são essenciais para que um italiano reconheça como ragu:

  • O ragu não é um molho de tomate com carne. É carne com tomates frescos ou em lata, que entram apenas para dar doçura, cor e profundidade de sabor. A estrela do molho é a carne.
  • A carne deve ser cozida no leite e vinho branco, que além de contribuir com textura, vão corrigir a acidez do tomate lá na frente.
  • É um molho de cozimento longo. Se você está com pressa, faz um pesto ou um carbonara. O bolonhesa exige tempo, pelo menos duas horas de cozimento.
  • Use uma panela grossa de ferro esmaltado ou pelo menos com um fundo triplo.
  • -Ragú alla bolognese jamais  é servido com espaguete (muito fino, deixa o molho sobrar no prato)! A massa correta para suportar esse molho tão encorpado e rico é o tagliatelleApesar dele dar pinta também no recheio da lasanha, do canelone ou com massas tabulares como rigatoni e penne.
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Uma pitada de Reportagem: Fraldinha, uma criação do mestre Marcos Bassi

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Pode se dizer que a Fraldinha como conhecemos e consumimos é uma invenção brasileira. Foi o infelizmente falecido mestre em carnes Marcos Bassi quem descobriu o corte. Como ele mesmo gostava de dizer “quem criou foi Deus, eu só encontrei”.

Conhecida na França como Bavete, Bassi descobriu a Fraldinha em 1967. A pedido de uma senhora francesa cliente do seu açougue, ele sempre preparava o corte até então desconhecido dos brasileiros. Até que o açougueiro decidiu preparar a carne assada e serví-la no balcão do açougue fatiada em sanduíches temperados com vinagrete. Sucesso absoluto. O amor pela Fraldinha foi tanto que com o tempo Bassi conseguiu promovê-la à carne nobre de churrasco, um hábito exclusivo dos brasileiros. Nem mesmo a França consome assim.

A Fraldinha vem da ponta carnuda da costela minga, próximo à perna traseira do boi, uma parte pequena do abdômen. O nome é um apelido dado devido à localização do corte. Ao lado da virilha do animal. Na França é chamada de bavette d’aloyau (francês), mas também recebe o nome de vacio (no espanhol) ou thin flank (em inglês).

As peças têm geralmente um quilo, com uma altura de três centímetros no começo e afinando do meio para o fim. É protegida por uma camada de gordura externa, se mantendo magra no interior, praticamente sem marmoreio. Mesmo assim graças a boa irrigação sanguínea é macia e, se preparada corretamente, fica extremante suculenta.

O sabor é sutil, e sua melhor performance é no churrasco. A dica não levar  a carne muito gelada ao fogo  e assá-la inteira e compactada no espeto para evitar o ressecamento.  Também fica bem ao fogão em ragus, braseados e ensopados. Mas para Bassi e seus seguidores, isso seria um desperdício.

Receita: Churrasco de fogão (Fraldinha na frigideira)

 


Uma pitada de reportagem: Moqueca, cada um na sua, mas com algo em comum

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Se perguntar para um baiano o que vai numa moqueca a resposta será bem diferente de um paraense. Para vandalizar ainda mais, chame um capixaba para a conversa. Provavelmente ele dirá: moqueca só tem no Espírito Santo, o resto é peixada.

Poucos pratos causam tanta polêmica, mas também são raros os que gozam de tanta popularidade e versões diferentes entre os brasileiros. É difícil afirmar qual a verdadeira. Até porque os africanos, antes mesmo de vir para o Brasil já faziam pratos bem similares com nomes diferentes.

Aqui o nome tem origem indígena, uma variação da palavra tupi pokeka, algo semelhante a embrulho. Representa o modo como os índios brasileiros preparavam os peixes envolvidos em folhas de bananeira com pimenta e colocavam para cozer na brasa.

Como afirmou o historiador Luís da Câmara Cascudo, no seu livro “História da Alimentação no Brasil”: “O cardápio brasileiro é uma incessante manobra aquisitiva de valores… Houve um processo aculturativo que não terminou. Conservam às vezes o nome, africano ou indígena, mas quase nada existe de autêntico na substância real. No primeiro caso, o vatapá e a feijoada completa. No segundo, o caruru, a moqueca de peixe”, anota.

Tais registros de Cascudo servem apenas para acalmar os ânimos dos puristas e dos radicais. No frigir dos ovos, praticamente todas as nossas receitas descendem de outras trazidas pra cá não só nos tempos do Brasil Colônia, bem como ao longo da construção de um ovem país. Logo, não há certo e errado, nem verdadeiro nem falso. E a moqueca é talvez a maior representante dessa trajetória.

 

Confira algumas versões de moqueca:

Receita de Moqueca Sertaneja da Margot

Receita de Moqueca africana (peixa à lumbo)

Receita de Moqueca Ovo Vegetariana

 


Uma pitada de reportagem: Bife à Parmegiana, brasileiro de nascença

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Engana-se e muito quem pensa que o Filé à Parmegiana é uma receita típica italiana. Ele foi inventado no Brasil, especificamente em São Paulo. Ninguém sabe dizer quem foi o autor da façanha. Mas bem provavelmente, o abençoado devia ser um imigrante italiano ou, no mínimo, um descendente.

Pode percorrer a Itália toda,  do cume do cano alto até a ponta da bota. Pode até caprichar no sotaque de novela e no gestual exagerado ao bradar “biffe alla parmaegiana”. O máximo que você vai encontrar é o cotoletta alla milanese  (bife à milanesa) e a parmigiana di melanzane (berinjela à parmigiana).

O bife, feito com bisteca (com o ossinho) de vitela batida, empanada e frita por imersão, provavelmente surgiu na cidade de Milão. Pelo menos são de lá os relatos mais antigos do prato. O escritor italiano Pietro Verri, em seu livro Storia di Milano (História de Milão), registrou ter comido o prato na Igreja de Santo Ambrósio em 1134 “coteletta impanata, fritta nel burro“.

Já o parmigiana na Itália,  por excelência, é a berinjela. Feita em fatias dispostas em camadas, regada com molho de tomate e salpicada com queijo parmesão. Muito tradicional nas regiões da Sicília,  Nápoles e, claro, Parma, na Emilia-Romana (terra natal do queijo parmesão). Sua origem é confusa e a autoria muito disputada como quase todas as receitas italianas.

termo parmigiana segundo o Devoto-Oli, dicionário muito famoso por lá, significa “cozinhar à maneira de Parma, isto é, como os habitantes da cidade de Parma, preparar os legumes em camadas.” Não coincidentemente, na Sicília, a palavra deriva de parmiciana, que se refere a janelas com tiras de madeira em camadas, semelhantes às nossas persianas. Exatamente a forma como é montado prato. Termologias usadas para reforçar a disputa pela autoria da receita.

Mas a parte que nos toca é que em algum momento aqui no Brasil isso tudo aportou. E os braços italianos importados como mão-de-obra barata, logo fundaram as cantinas. Outra invenção dos ítalos-brasileiros que não existe na Itália. E nesses restaurantes simples não se sabe se o bife à milanesa que evoluiu ou se foi a berinjela. A única certeza é que os imigrantes, na tentativa de matar a saudade da terra natal, criaram um dos melhores PFs do Brasil.

 

 Receita passo a passo: Filé à Parmegiana

 


Uma pitada de reportagem: O Arroz Doce de Michelangelo, de Luís IX e dos noivos

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Sim, o Arroz Doce era a receita de Michelangelo para curar a ressaca e também a sobremesa favorita de Luís IX. Mas a lenda mais fofa em torno da receita é  a dos noivos.  Segundo Roberta Malta Saldanha, autora de Histórias, Lendas e Curiosidades da Gastronomia (ed. Senac), era tradição na região de Coimbra, os futuros casais noivos entregarem um prato da sobremesa junto com o convite de casamento. O preparo vinha coberto com uma toalha feita pela noiva, conhecida como o pano de Almalaguês. Depois de uma semana, eles voltavam para buscar a travessa e com ela o presente de casamento.

Mas o hábito de comer Arroz Doce é bem provável que seja anterior ao matrimônio nos moldes ocidentais. Há registros da receitam que datam da antiguidade em países do Oriente como China. Japão, Índia, Paquistão e também no Sudeste Asiático.
No Brasil, para variar, é herança dos portugueses. E estes, por sua vez, também sem grandes novidades, emprestaram dos árabes o preparo. Tanto que na culinária sírio-libanesa há uma sobremesa bem semelhante. O Roz bi Halib é perfumado com água de rosas ou flor de laranjeira.
Fato é que hoje o mundo todo come arroz, logo, o mundo todo em algum momento, testou  o grão na versão doce.  Há variações que levam frutas secas, sementes, castanhas e amêndoas e muita canela. Essa última, por sinal, era a favorita de Luís  IX, que devorava travessas várias vezes ao dia.
Receita: Arroz Doce Brulée com Leite Queimado e Raspas de Laranja